“A verdade e a justiça estão sendo restabelecidas” afirmou o presidente do PT gaúcho Raul Pont, ao comentar a sentença que condena a Ford a ressarcir os cofres do Estado do Rio Grande do Sul em mais de R$ 162 milhões pelo descumprimento do contrato firmado com o governo em 1998. A indenização pode chegar a R$ 1,6 bi em valores atuais.
A decisão foi reiterada pela juíza Lilian Siman, da 5ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre, que em 2009 já determinara o ressarcimento anulado por recurso da Ford.
Em 1999, quando a Ford retirou se do Estado, de forma unilateral, o governo de Olívio Dutra foi atacado política e ideologicamente pela oposição, de ser o “governo que mandara a Ford embora”. Na verdade, a decisão judicial de hoje prova duas coisas: primeiro que a oposição ao governo Olívio Dutra, governo federal da época, operaram para que a Ford saísse daqui e fosse para a Bahia. Segundo, que a Ford não foi mandada embora, mas rompeu contrato com o Estado do RS descumprindo o acordo assinado e deixando as contas para pagar.
A Ford acabou trocando o Rio Grande do Sul pela Bahia em um processo que envolveu, entre outras decisões, a edição de uma Medida Provisória pelo governo Fernando Henrique Cardoso estabelecendo vantagens muito maiores para a empresa se instalar em Camaçari. Na época e nos anos seguintes, Olívio Dutra qualificou o episódio como um desrespeito ao pacto federativo. “Uma unidade da Federação, com um governo eleito, com um programa, buscou sentar com uma empresa do porte da Ford para tentar renegociar um acordo com um custo menor para o Estado. A União se atravessou no caminho, se sobrepondo a essa negociação, possibilitando que a Ford saísse da mesa”, disse o ex-chefe do Executivo gaúcho Olívio Dutra em entrevista a CARTA MAIOR em 2006.
SENTENÇA
Na decisão, a magistrada reconhece que a Ford foi responsável pelo rompimento do contrato e que o governo cumpriu todos os pontos previstos no contrato firmado ainda em março de 1998. Naquela época, foram investidos valores em obras de infraestrutura na área onde seria instalado o complexo industrial e outras despesas em torno do projeto.
Em 1999, a Ford teria que fazer uma prestação de contas sobre os gastos com o projeto no Rio Grande do Sul, mas os documentos foram considerados insuficientes pela Contadoria e Auditoria Geral do Estado (Cage). Conforme a sentença, antes mesmo da conclusão dos trabalhos da Cage, a Ford já havia se retirado do empreendimento por iniciativa própria, anunciando a ida para a Bahia – sem encerrar tratativas oficiais com o governo da época.
AÇÕES DE FHC
Também ficou provado que na época, o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso – PSDB – o governador da Bahia César Borges e o Senador Antônio Carlos Magalhães operaram para levar a empresa automobilística para aquele estado.
Vários manobras foram feitas para esta mudança, que atacava a principal força de oposição eleita em um estado de peso industrial como o Rio Grande do Sul, o governo petista de Olívio Dutra.
No dia 29 de junho de 1999, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei de conversão a MP 1740, prorrogando, ate 31 de dezembro daquele ano, incentivos fiscais para a instalação de montadoras no país. A decisão beneficiou diretamente a Ford, que decidiu levar para a Bahia a montadora que seria instalada inicialmente no Rio Grande do Sul. A Medida Provisória, que estava na 32ª edição, previa apenas a prorrogação de incentivos fiscais para o Nordeste e a Amazônia. Porém, o projeto de lei de conversão apresentado pelo deputado federal José Carlos Aleluia (PFL/BA), incluiu a extensão dos benefícios a montadoras, que haviam expirado em maio de 1997.
O governo da Bahia, com apoio do governo federal apresentou um pacote de benefícios. Além do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), vários outros entraram no pacote. O BNDS acertou um financiamento no valor de R$ 1,5 bilhão para a implantação. Mas, a Ford estava tendo dificuldades para liberar esses recursos. Dois ou três meses depois, esse financiamento acabou sendo viabilizado. Além desses recursos houve outros benefícios concedidos pelo governo federal à Bahia, como a redução de 75% no Imposto de Renda, de 50% no imposto de importação e de 50% no Imposto de Operações Financeiras. “Tanto é verdade que César Borges, governador do Estado, afirma que fez questão de procurar FHC para agradecer o seu empenho em levar a Ford para a Bahia”, revelou o Secretário de Desenvolvimento e Assuntos Internacionais Zeca Moraes do governo petista a época. O governo baiano também se comprometeu em garantir os recursos da diferença em relação ao incentivo fiscal que poderia deixar de ser recebido. Outro elemento é a conta telefônica da Ford que acabou sendo paga pelo governo baiano.
Com informações do site Sul21
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NOTA DA JUSTIÇA NA ÍNTEGRA
Por não instalar fábrica no RS, Ford é condenada a ressarcir o Estado em mais de R$ 160 milhões
Uma decisão da 5ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre condenou a empresa Ford ao ressarcimento do Estado do RS com investimentos realizados para a implantação de uma filial da empresa em 1998. Na época, a Ford já havia recebido recursos para o início das obras de instalação da fábrica, quando se retirou do negócio alegando falta de pagamento por parte do novo Governo que assumia em 1999.
Caso
Em 1998, a Ford assinou contrato para a instalação de uma fábrica de automóveis na cidade de Guaíba. Também foi assinado um financiamento com o Banrisul de forma a disponibilizar para a empresa a quantia de R$ 210 milhões. Pelo acordado, o dinheiro seria liberado aos poucos, mediante prestação de contas das etapas. No entanto, após o pagamento da primeira parcela, a Ford se retirou do negócio alegando que o Estado estava em atraso no pagamento da segunda parcela. Também alegou motivos de ordem política com o novo governo que assumia.
Segundo o processo, movido pelo Governo do Estado, o negócio trouxe muitos prejuízos ao erário público. Na época, houve, inclusive, a CPI da Ford, que constatou o dever de restituir por parte da empresa ré.
Foi ajuizada ação para devolução da primeira parcela do financiamento no valor de R$ 42 milhões, gastos com aquisição de máquinas e equipamentos para as obras no valor de cerca de R$ 93 milhões e perdas e danos pelos gastos com a colocação de servidores públicos à disposição do desenvolvimento do projeto, despesas com publicações de atos na imprensa e com estudos técnicos e análises para disponibilização de infra-estrutura; custos com publicações de decretos de desapropriação e indenização aos proprietários expropriados com juros compensatórios; despesas com taxas, emolumentos e registro de atos do contrato; honorários advocatícios decorrentes de discussões quanto à imissão provisória na posse; despesas no Porto de Rio Grande não incluídas no financiamento; e custos com licitações.
Uma ação popular, proposta por um advogado, sobre o mesmo tema também pediu o ressarcimento dos danos ao erário do estado, bem como a responsabilização por improbidade administrativa do Ex-Governado Antônio Britto, dos ex-secretários Cezar Busatto e Nelson Proença, do ex-presidente do Banrisul, Ricardo Russowski e o ex-prefeito de Guaíba Nelson Cornetet, já falecido.
Decisão
A Juíza de Direito Lílian Cristiane Siman, da 5ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto Alegre, julgou parcialmente procedentes os pedidos.
Segundo a magistrada, sobre o desfazimento do negócio pela ré, ficou demonstrada a inadequação do procedimento da mesma ao retirar-se do empreendimento na pendência da prestação de contas. Entre a data prevista para a liberação da segunda parcela do financiamento e a notificação da empresa informando sobre sua retirada do empreendimento decorreram somente 29 dias, o que, pelo volume de documentação acostada com a prestação de contas, não é excessivo.
A Juíza também destacou o fato alegado pela ré, para abandonar o negócio, de que já teria havido a prorrogação da liberação da segunda parcela do financiamento, de 30/09/1998 para 31/03/1999. No entanto, a magistrada explica que o suposto atraso (suposto porque, na verdade, não se implementou, mas sim teve retardado seu implemento porque condicionado á regularidade da prestação de contas relativa à primeira parcela do financiamento), de 29 dias não justificaria a postura adotada pela ré, retirando-se do empreendimento.
A cláusula 12ª do contrato previu: Caso a Ford, injustificadamente, venha a desistir da implantação do Complexo, ficará obrigada a devolver, a valor presente, ao Estado e/ou Município, as importâncias recebidas…, obrigando-se, ainda, por ressarcir o Estado pelos gastos por realizados em obras de infra-estrutura dentro da área do Complexo Ford.
A magistrada determinou que o contrato está formalmente rescindido. Também condenou a Ford à devolução da primeira parcela do financiamento no valor de R$ 36 milhões (R$ 42 milhões iniciais, dos quais devem ser deduzidos R$ 6 milhões,relativo à terraplenagem do terreno onde seria instalado o complexo e se somou ao patrimônio do autor da ação), cerca de R$ 93 milhões referentes à aquisição de máquinas e equipamentos e cerca de R$ 33 milhões referentes aos estudos técnicos e análises para disponibilização de infraestrutura.
Todos os valores devem ser corrigidos pelo IGP-M e acrescidos de juros de 6% ao ano, a contar da citação até a vigência do Novo código Civil (10/01/2003), após os juros devem ser calculados em 12% ao ano.
Quanto à ação popular, a magistrada afirmou que é descabida a pretensão do autor de, por meio de ação popular, postular pela responsabilização dos réus por improbidade administrativa. Dessa forma, foi extinta a referida ação.
Cabe recurso da decisão ao TJRS.
Proc. nº 10503209370 (COmarca de Porto Alegre)