terça-feira, 19 de julho de 2011

Estado laico avança no Peru; no Brasil, recua




O Congresso do Peru aprovou, dia 13, alteração na legislação nacional que muda a Lei da Liberdade Religiosa no país. Pela mudança, desde que haja solicitação dos pais, as crianças terão o direito de não frequentar as aulas de religião nas escolas públicas e privadas. Os alunos estão dispensados das aulas de religião “por motivos de consciência ou em razão das suas convicções religiosas”. Ficou determinado ainda que as escolas definam um currículo “não baseado em valores ou princípios religiosos em todos os níveis de ensino”. 

Já no Brasil, o ensino religioso está presente nos textos constitucionais republicanas desde 1934. Além disso, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (lei federal 9.394/96, modificada pela lei 9.475/97, determina: 

“Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.

§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores.

§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas para a definição dos conteúdos do ensino religioso.”

As mudanças ocorridas da lei de 1996 para a de 97 transformaram o ensino religioso em “disciplina”, portanto obrigatório no currículo (na lei de 96 era opcional) e suprimiram o item que explicitava que o ensino religioso seria oferecido sem ônus para os cofres públicos, abrindo a possibilidade dos pregadores, digo, professores de religião serem remunerados.

Em junho passado, relatório apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) apontou que centenas de escolas públicas em pelo menos 11 Estados do Brasil não seguem os preceitos do caráter laico do Estado e impõem o ensino religioso. Os Estados citados são Alagoas, Amapá, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.

Há pedagogos que entendem que nas escolas públicas deve vigorar a laicidade e o Estado deve assumir uma neutralidade positiva no que se refere à religião. A professora Roseli Fischmann, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Metodista, de São Bernardo do Campo, é autora de “Ensino Religioso em Escolas Públicas: Impactos sobre o Estado Laico”. Ela denuncia que, nas escolas, a religião “aparece, sempre de forma irregular, das mais diversas maneiras: o crucifixo na parede, imagens de santos ou de Maria nos diversos ambientes, no ato de rezar antes da merenda e das aulas, na comemoração de datas religiosas. Alguns professores chegam a usar textos bíblicos como material pedagógico para o ensino da Língua Portuguesa ou para trabalhar conteúdos de outras disciplinas. É um equívoco chamar essa abordagem de transversal” porque quem faz isso enxerta conteúdo de uma disciplina facultativa numa obrigatória”. 

E contra-argumenta para os que dizem que o ensino religioso é instrumento para a paz nas escolas: “A religião não impede a violência. A ideia de que ela sempre faz bem é equivocada. Basta lembrar que grande parte das guerras teve origem em conflitos religiosos. Na escola, a violência deve ser combatida com o ensino ao respeito e ao reconhecimento da dignidade intrínseca a todos, não com o pensamento de que apenas as pessoas que acreditam na mesma divindade merecem consideração”. 

Mas esse pensamento não é predominante em nosso país e entre nossos governantes. Pelo contrário, desde o dia 4 de julho, no Rio de Janeiro, as bibliotecas situadas no estado terão de disponibilizar exemplares da Bíblia. É o que determina a lei 5.998/11, de autoria do deputado Edson Albertassi (PMDB). A nova regra impõe multa de mil a duas mil Ufirs às bibliotecas que não a respeitarem. Detalhe: não há lei que multe ou obrigue qualquer biblioteca a ter ao menos um exemplar de um Dicionário da Língua Portuguesa...



Carlos Pompe. vermelho.com

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