quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Enfrentamentos reais e miragens conservadoras


  A adesão da Venezuela como membro pleno do Mercosul consolida no
coração da América Latina uma referência de recorte progressista como
talvez nunca tenha existido na região, com a abrangência institucional
e o fôlego econômico intrínseco ao bloco agora liderado por Dilma
Rousseff, Cristina Kirchner, Pepe Mujica e Chávez.

Cuba certamente exerceu um magnetismo ideológico superior ao desse
quarteto nos anos 60, mas esse ardor não se traduziu em uma
organização duradoura com o alcance potencial que o Mercosul desfruta
e deve ampliar, graças à incorporação do detentor da maior reserva de
petróleo cru do mundo (a Venezuela tem 296,5 bilhões de barris,
seguida da Arábia Saudita,com 264,5 bilhões de barris).

Trata-se de mais um enfrentamento no qual os interesses conservadores,
muito bem refletidos no bombardeio midiático contrário a essa
inclusão, foram habilidosamente derrotados . Não é um revés em torno
de uma questiúncula pontual. Os que hoje, como há uma década, sopram o
interdito à presença venezuelana, são os mesmos que, paralelamente,
defenderam à exaustão a ALCA, como alternativa a uma inserção global
do continente assumidamente subordinada e dependente do gigantesco
mercado norte-americano. Foram derrotados.

Há pouco, no golpe contra Lugo, encrespado com a suspensão dos
golpistas no âmbito do Mercosul, o jornal 'Estadão' destilou a
nostalgia da velha agenda. Em editorial efervescente aconselhou a
direita paraguaia a responder à punição jogando-se nos braços dos EUA,
de modo a consumar, pelo menos, mais uma mini-Alca regional, expressão
cunhada pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, em coluna recente
em Carta Maior.

A opção de desenvolvimento regional integrado e soberano , reafirmada
pela Cúpula de Brasília do Mercosul, insere-se assim numa espiral de
enfrentamentos em que o guarda-chuva maior do conservadorismo verga
sob o peso da dissolução da ordem neoliberal. É nesse esquina de
derrotas históricas apreciáveis que a seção brasileira perfila armas e
concentra tropas para fazer do julgamento do chamado mensalão uma
espécie de 3º turno simbólico de sua anemia política.

O julgamento que começa nesta 5ª feira oferece-se como um raro campo
em que a relação de forças aparenta ser-lhes favorável. Mídia e
judiciário conjugam-se como donos de um espetáculo em que 38 réus,
entre eles algumas das maiores lideranças do PT, 50 mil páginas
processuais e 600 testemunhas ouvidas serão esmiuçadas e reiteradas em
15 sessões, somando-se um total de 90 horas de julgamento, a ocupar os
holofotes noticiosos ao longo de todo o mês de agosto e 1ª quinzena de
setembro.

Não se subestime o poder de fogo dessa parafernália. Mas não se perca
o pano de fundo sobre a qual ela se dá. O conservadorismo aferra-se à
batalha do dia anterior na esperança de apagar do imaginário social a
percepção de que seus interesses e credo são parte de um mundo que
ruiu. A ver.

Postado por Saul Leblon às 06:57

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