Igor Natusch
Os reflexos da investigação promovida pelo Ministério Público para desbaratar o esquema de desvio de recursos do Banrisul atingiram pelo menos um nome forte na política do RS. Rodolfo Rospide Neto (PMDB), deputado estadual por quatro mandatos, ex-tesoureiro da sigla e ex-assessor da presidência do Banrisul, está na lista de 25 acusados de envolvimento em uma quadrilha que transformou o marketing do banco em um escoadouro de dinheiro. Entrando, inclusive, na folha de pagamentos do esquema, com valores de até R$ 20 mil.
Segundo a denúncia apresentada pelo MP, Rospide Neto valeu-se de sua condição de assessor da presidência da instituição, na gestão de Fernando Lemos, e de seus contatos políticos para estabelecer e manter o esquema que desviava recursos de publicidade do Banrisul. Gravações demonstram que o peemedebista fazia frequentes contatos com Davi Antunes de Oliveira, empresário responsável pelo gerenciamento das empresas envolvidas na fraude. Além disso, mensagens de e-mail obtidas pela investigação comprovam também que Armando D’Elia Neto, diretor da agência DCS, tomava parte em alguns desses encontros.
A ligação entre os três é fortalecida por evidências como uma mensagem de celular enviada por Davi para Armando no dia 4 de agosto de 2010, na qual se lê: “Noticias importantes, recebi tarefa do maninho e Rospi para marcar com teu boss”. Na interpretação do MP, o fato de Rospide dar uma “tarefa” a Davi evidencia a ascendência que ele tinha dentro da quadrilha. Em outra troca de mensagens entre Davi e Armando, o empresário avisa ao diretor da DCS que está “indo no galeto com Rospi”, indicação de que o encontro era importante dentro das movimentações da quadrilha.
Em escuta telefônica, gravada no dia 31 de agosto do mesmo ano, Davi Antunes de Oliveira e Armando D’Elia Neto explicitam não apenas a importância de Rospide Neto como também o jogo político que dá as diretrizes para a participação de partidos e agências publicitárias em esquemas do tipo. Nesse diálogo, Rospide Neto é chamado de “velhinho”:
ARMANDO – Já falei disso lá com o nosso amigo, que se der PMDB é grande a chance de voltar novembro e dezembro as coisas lá…
DAVI – É, mas mesmo que seja PSDB e tal, alguma campanha eles vão ter que botar no ar, né? Mesmo que em novembro, quando voltar o dinheiro de campanha, alguma coisa eles vão ter que botar. Eles não podem ficar sem botar nada, né?
ARMANDO -- Sim, volta. E outra coisa, e as pernas de anão lá dos amigos aí do PMDB?
DAVI – Olha meu, perna de anão para caralho, velho! Para caralho! Eu chamei o velhinho aqui hoje de manhã e ele vai vir aqui de manhã e eu vou dar um no cu dele! Mas ele disse “não Davi, tu pode ficar tranquilo, na hora que apertar mesmo, na hora em que não tiver dinheiro para pagar ninguém, eu te pago. Não é o problema, não te transtorna. Se tu perder, perde trinta ou quarenta pila, um carro, trinta ou quarenta conto”. Tão a fim de me foder, né? Aí ele já disse “Bom, mas se nós ganharmos, é barbada, porque os negos vão dizer: esses aqui são os parceiros e nós ganhamos e que se foda! Aí eles vão buscar lá dentro. Se nós perdermos ele vai tentar tomar o dinheiro de qualquer jeito”.
ARMANDO – Entendi, entendi. Vamos ficar em passinho de espera dessa aí.
DAVI – É, a verdade é a seguinte: ele vai nos deixar sempre pelo meio do caminho! Se nos der cem, nós vamos estar sempre com cinquenta atrás. Se nós ganharmos a eleição já era os cinquenta, se nós perdermos a eleição ele vai tentar nos pagar tudo, por que aí vai ter que pagar alguns mesmo, então foda-se os outros, vamos pagar os amigos. Agora, se nós ganharmos os amigos vão pagar os chatinhos de baixo, para dizer como assim “tu me fez um favor, eu te paguei”. Entendeu? Para eliminar esses. Um jogo antigo, mas correto, né?
ARMANDO – Há cem anos.
DAVI – Não entendi.
ARMANDO – O jogo é este já há cem anos.
DAVI – Vão mudar agora? Não vão, né?
A partir da leitura do diálogo acima, o Ministério Púbico concluiu que as empresas cobram dos partidos apenas 50% do valor do serviço prestado às legendas durante a campanha eleitoral. Se o partido que vence as eleições é próximo do empresário, os outros 50% não serão pagos diretamente por eles. Os valores seriam embutidos nos contratos a serem firmados com os órgãos públicos. Se o empresário não é tão próximo da legenda vencedora, os restantes 50% são pagos pelo próprio partido. No caso dos partidos perdedores, os empresários mais próximos dos políticos recebem integralmente os valores. Os demais ficam com o crédito em haver.
Planilhas contidas em uma pasta de arquivos relacionada à Expointer 2009, obtida pelo MP durante a investigação, trazem menções a “Rospi” e “Velho”, que parecem indicar o repasse de valores para Rodolfo Rospide Neto. Nessas citações, constam valores de R$ 3.500, R$ 6.800 e R$ 20.000, entre outros. Logo após a deflagração da operação que realizou buscas e prendeu alguns integrantes do esquema, em setembro do ano passado, Davi Antunes de Oliveira ligou para Rodolfo Rospide Neto. Na gravação, o ex-deputado pergunta a Davi se ele mantinha nomes em arquivos e documentos em um sinal de preocupação com uma eventual identificação dos envolvidos.
Evidências da participação de Rospide Neto no esquema surgem em uma conversa anterior, datada do dia 19 de maio de 2010, na qual o peemedebista é um dos protagonistas. Naquele momento, havia sido concretizada a mudança de comando no Banrisul, com a posse de Mateus Bandeira no lugar de Fernando Lemos, deslocado pela então governadora Yeda Crusius para o Tribunal de Justiça Militar. Aparentando preocupação com a disposição do novo presidente do banco em cortar verbas publicitárias, Rodolfo Rospide Neto telefonou a Walney Fehlberg, então superintendente de marketing do Banrisul, para tentar “salvar ao menos a metade” dos valores:
WALNEY – Alô.
ROSPIDE – Oi. Tá no trabalho?
WALNEY – Não. Tô fora.
ROSPIDE – Ah, tá fora?
WALNEY – Tô fazendo um trabalho pro homem aí. Aquele assunto ainda não fluiu, tá? Acho que vai ser para semana que vem.
ROSPIDE -- Isso. Mas seguinte, eu soube que tão cortando tudo.
WALNEY – Tão. Vão cortar tudo.
ROSPIDE – Nós temos que salvar. Temos que salvar. Salvar ao menos a metade, rapaz!
WALNEY – Não há como. Não há como.
ROSPIDE – Mas será mesmo?
WALNEY – É. O cara (Bandeira) não quer nem saber. O cara não quer nem saber quem é o pai da criança.
ROSPIDE -- Barbaridade!
WALNEY – É. Mas eu acho que dá um tempo e depois a gente volta.
ROSPIDE – Pois é. Mas dá um tempo.
WALNEY – É, vai fazer o que, né? É incompreensível. Mas não vamos nos apavorar, alardear, porque de repente muda, porque ainda não se chegou onde tinha que chegar.
ROSPIDE – Sei. Mas em todo caso eu conto contigo. Se consegue segurar.
WALNEY – Claro. Com certeza.
A reportagem do Sul21 tentou contatar Rodolfo Rospide Neto por telefone, mas o ex-tesoureiro do PMDB não respondeu as ligações. A assessoria de imprensa do PMDB informou que a Executiva estadual da sigla não irá se pronunciar sobre o caso até que haja um veredito da Justiça. Por meio da assessoria, o secretário-geral do PMDB-RS, João Alberto, informou que o cuidado deve-se à “imagem perfeita” de Rospide Neto dentro do partido, sendo uma pessoa respeitada por todos e que jamais se comportou de forma a levantar qualquer questionamento quanto à sua integridade.
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