quinta-feira, 7 de abril de 2011

Reforma Agrária - Terreno pertencia a traficante internacional de drogas.



Traficante colombiano criava 15 cavalos nas terras que agora produzem arroz orgânico - Ramiro Furquim/Sul21

A terra que hoje fornece alimento para a merenda escolar de milhares de estudantes em todo o Brasil já foi utilizada para propósitos bem menos nobres. Mais precisamente aos negócios escusos do traficante internacional Juan Carlos Ramirez Abadía. O terreno era parte das quase infidáveis posses do colombiano Abadía no Brasil, mas não era usado para o cultivo ou produção de drogas. Era, isso sim, um gigantesco haras, no qual o traficante criava cerca de 15 cavalos de raça. “Os cavalos eram criados à base de chocolate. Chocolate mesmo, alfafa e chocolate!”, admira-se Jaqueline.

Muito bem alimentados de cacau, os cavalos descansavam em grandes baias, enquanto o proprietário do terreno pensava em investimentos ainda mais altos. A ideia de Abadia, segundo os atuais moradores do assentamento, era construir no local uma das maiores arenas de rodeio da América Latina. No entanto, a Justiça alcançou Abadía antes que as obras tivessem início, e frustrou os planos empreendedores do traficante internacional.
As origens pouco nobres da terra acabaram sendo positivas para o MST na luta pelo apoio da comunidade. O que não quer dizer que o assentamento tenha acontecido sem sobressaltos. “Foi uma ocupação que durou bastante tempo”, explica Jaqueline. Durante 58 dias, os trabalhadores rurais ficaram no terreno, esperando uma definição, sem aceitar os argumentos usados para convencê-los a sair. “Eles (governo) não tinham argumentos para as famílias”, diz Jaqueline. “Nosso argumento era de que queríamos produzir, e eles não tinham elementos para nos contestar, porque era terra de traficante, de lavagem de dinheiro. Mas acabou sendo bom, porque a sociedade ficou do nosso lado. Conseguimos fazer esse diálogo”.




Mãe de Jaqueline foi presa no confronto da Praça da Matriz
A mãe de Jaqueline Nunes, Elenir, foi uma das pessoas presas após o tristemente notório incidente na Praça da Matriz, em 1990, quando uma violenta tentativa de dispersar agricultores resultou na morte de Valdeci de Abreu Lopes, cabo da Brigada Militar. O fato marcou o MST, que a partir dali passou a ser visto por muitos como uma organização criminosa — imagem que, para vários setores, segue intocada. “Foi uma coisa que marcou muito”, admite Jaqueline, em um dos poucos momentos em que seu olhar desvia do interlocutor e volta-se para o vazio.
Sete pessoas foram presas pela morte de Valdeci. Durante anos, a versão oficial foi de que, agredido por uma foice, o cabo teria atirado a esmo uma ou duas vezes antes de tombar morto. Mais tarde, os autos do processo relevaram outra versão: a de que o golpe fatal teria sido provavelmente uma atitude de defesa, após os disparos, já que uma pessoa golpeada na artéria carótida perde os sentidos quase que imediatamente.
Dos sete presos, a mãe de Jaqueline foi a única mulher. Aparentemente, nenhum dos que assumiram a responsabilidade estava de fato envolvido no crime. Ao levarem a culpa pela morte do policial militar, eles seguiram o princípio do MST de não personalizar ações. Elenir Nunes foi uma das pessoas baleadas por Valdeci — vítima dos tiros, acabou transformada pelo inquérito em culpada de assassinato.
O confronto na Praça da Matriz acabou marcando decisivamente a relação entre Jaqueline Nunes e a mãe. A filha evita detalhes, não se aprofunda na história, mas admite que pouco viu Elenir nos anos de prisão e que passou a ser filha de “duas famílias”. Hoje, ela tem uma terceira família: a própria. Seu marido trabalha longe, voltando apenas nos finais de semana; seu filho passa a maior parte do tempo na escola ou sob os cuidados da madrinha. Enquanto isso, Jaqueline trabalha em nome do MST, ajudando outras famílias a colocar um fim na caminhada em busca de terra.



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